É seguro andar de moto?
Por Fernando Medeiros
Você considera seguro andar de moto? A grande maioria das pessoas certamente responderia que não! Parte delas provavelmente veio seguida de algum relato escabroso sobre acidentes com motocicletas. A imagem negativa permeia o universo das duas rodas, mas mesmo que pareça óbvio do ponto de vista da opinião pública, será verdade que a motocicleta mereça o título de vilã?
Proponho uma reflexão justamente na direção contrária deste consciente coletivo, a fim de promover o debate, a conscientização e por que não pensar em mudanças na política de formação e educação dos condutores?
Como usuário diário de motocicleta, posso afirmar que a moto é um meio de transporte seguro. Inseguras são as pessoas e a educação que possuem. Recentemente foi divulgada uma importante pesquisa sobre o tema, realizada pela Faculdade de Medicina da USP, em parceria com a ABRACICLO, entidade que representa os fabricantes de motos, bicicletas e ciclomotores, e assinada pela Dra. Julia Greve. A pesquisa teve como objetivo apurar as causas de acidentes com motocicletas com vítimas na zona oeste da cidade de São Paulo.
Estudos para conhecer melhor o universo das motos, com elevado nível, profissionalismo e embasamento técnico são muito raros, portanto estes dados, apesar de regionais são relevantes para quem deseja discutir o tema à luz da razão. Alguns números chamam bastante a atenção e até surpreendem no sentido de revelar o quanto pode ser feito e como ainda perdemos vidas por causas banais.
Foram avaliados 310 acidentes que resultaram em 326 vítimas com entrada em hospital. É importante ressaltar que só foram avaliados acidentes cujas vítimas deram entrada em hospitais, portanto não é possível avaliar por exemplo o percentual de acidentes que geram vítimas ou mesmo comparar com a frota circulante pois os dados são regionais.
O mais surpreendente na pesquisa é que apesar de serem a maioria e de estarem mais tempo pilotando, os motociclistas profissionais são a minoria entre os acidentados. Cerca de 77% dos pesquisados utilizavam a moto apenas para transporte, enquanto apenas 23% eram profissionais. A diferença é gritante, ainda mais se considerarmos que os motociclistas que utilizam a moto apenas para transporte, pilotam por cerca de duas horas por dia, enquanto os profissionais passam cerca de oito horas diárias sob duas rodas. Esta é a primeira evidência de que a aptidão para pilotar é fator muito relevante. Outra informação importante que consta no estudo é que um em cada quatro acidentados estavam sob o efeito de drogas ou álcool.
Em 49% dos casos os laudos periciais apontam que a moto foi a causadora do acidente, enquanto em 51% outros veículos foram os causadores. No caso da moto, 88% dos acidentes foram causados por imprudência do piloto. Já nos casos em que outros veículos causaram o acidente, em 84% deles a imprudência de quem guiava o carro foi a causadora.
Quando avaliado o uso de equipamentos de segurança, o resultado foi tão surpreendente quanto lamentável. Apenas 90,2% dos usuários estavam de capacete, e 17,8% estavam devidamente equipados com luvas e jaquetas. Problemas nas vias foram responsáveis por 18% dos acidentes e 8% foram causados por má conservação das motos, principalmente freios e pneus.
Como 80% dos acidentes ocorreram com motos até 250 cilindradas, cabe aqui uma observação. Um jogo de pneus destas motos não chega a R$ 200,00 e a manutenção dos freios também não chega a outros R$ 200,00. Considerando que estes itens demoram meses para se desgastar, vemos o quanto alguns destes acidentes poderiam ser evitados.
Estes e muitos outros dados do estudo deixam bastante evidente que o principal problema é o comportamento do piloto e o preparo que tem para utilizar uma motocicleta. O uso de motocicleta envolve um componente que a maioria dos outros veículos não envolve, que é a emoção e adrenalina.
Mesmo no mais singelo passeio o piloto pode obter emoção de forma muito rápida e acessível, e é justamente nesta hora que a educação, consciência e senso de limite tem que agir. Andar de moto é seguro, apesar de ser maior o risco de lesão em caso de acidente. O ato de andar de moto em si é seguro, desde que haja preparo e condições adequadas para isto.
As motos fazem parte da realidade do nosso país, são produtivas do ponto de vista econômico em toda sua cadeia, desde a produção até o uso na prestação de serviços.Também são importantes do ponto de vista social, pois empregam milhões de brasileiros. Somente com educação, boa formação dos condutores e boas condições nas vias públicas é que vamos reverter este quadro trágico de acidentes que poderiam ser evitados.
Passou da hora de incluir na grade curricular das escolas a educação no trânsito e também de rever o modelo atual de concessão de habilitação. Enquanto isto não acontecer e as autoridades de trânsito ignorarem a existência das motocicletas em termos de planejamento viário e sinalização de trânsito, não teremos mudanças nestas estatísticas e continuaremos assistindo nossos jovens se acabando no por motivos banais. Triste realidade.
Fernando Medeiros é diretor executivo da ASSOHONDA.